Claudia Jurberg
Grupo coordenado por Débora Muchaluat Saade e Célio Albuquerque (na foto, diante de laptops) na UFF tem se dedicado aos estudos de Wi-Fi CSI. Cerca de 130 voluntários já cederam seus dados CSI em atividades como caminhar, sentar, deitar, entre outras 17 posições |
Imagine usar as redes Wi-Fi caseiras para monitoramento contínuo, em tempo real, de sinais vitais como batimentos cardíacos, frequência respiratória, tremores ou quedas de pacientes. Pode parecer filme de ficção científica, mas a Inteligência Artificial já está sendo aplicada para, em um futuro não muito distante, ser útil a pacientes, familiares, médicos e unidades de saúde. E o Brasil, também avança nessa área.
Esse tipo de monitoramento é viabilizado pela tecnologia da coleta de dados por meio das redes Wi-Fi. Este tipo de rede já está disponível em quase todos os ambientes médicos e residenciais. A tecnologia é amplamente difundida no mundo e sua aplicação à saúde é considerada de baixo custo, uma vez que se aproveita de dispositivos já utilizados. E mais, seu uso é considerado não invasivo, pois não há a necessidade de intervenção física no paciente. Mas sozinha a rede Wi-Fi não processa as informações dos pacientes. E aí entra a tecnologia CSI.
O CSI (do inglês, Channel State Information) representa informações das ondas portadoras do sinal Wi-Fi e permite personalizar características de cada indivíduo, transformando-as em padrões que possam ser úteis, por exemplo, para acompanhar pacientes de forma remota, a partir de um roteador caseiro. Os dados podem ser disponibilizados na nuvem, e acessados pelo profissional de saúde por meio de um celular ou notebook.
No Brasil, um grupo de pesquisadores tem se dedicado aos estudos de Wi-Fi CSI. E cerca de 130 voluntários já cederam seus dados CSI em atividades como caminhar, sentar, deitar, entre outras 17 posições. Faltam agora dados de mais 170 voluntários para avançar a pesquisa com essa tecnologia em um estudo da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Coordenado por Débora Muchaluat Saade e Célio Albuquerque, ambos professores do Departamento de Ciência da Computação da UFF, o projeto visa contribuir com os estudos mundiais e ampliar os dados CSI para eHealth. A ideia é que, no futuro, a rede Wi-Fi na casa das pessoas possa enviar dados de saúde de cada um, a partir de um padrão pré-estabelecido, identificar comportamentos e alertar distúrbios.
"Com o uso da Inteligência Artificial, poderemos ajudar, por exemplo, quem sofre de apneia do sono, ou falta de ar. A pessoa poderá ser diagnosticada sem aqueles fios desagradáveis acoplados ao corpo. A rede Wi-Fi será capaz de captar as informações, processá-las e enviar sem a necessidade de outros equipamentos", explica Débora.
Além do monitoramento da apneia e da respiração, o grupo da UFF está especialmente interessado em temas como controle de batimentos cardíacos. Na pesquisa de batimentos cardíacos por redes Wi-Fi CSI, fazem comparações de eficiência desse sistema com dados de relógios do tipo smartwatch, que é muito mais que um simples relógio. É uma tecnologia que agrega funções como arritmia cardíaca, nível de oxigênio ou pressão arterial. Segundo Muchaluat, os resultados de batimentos cardíacos detectados com Wi-Fi CSI, aparentemente, têm sido similares aos de um smartwatch.
Apesar dos avanços, ainda não há nenhum produto sendo comercializado nem no Brasil e nem no exterior, mas a tecnologia evoluiu muito nos últimos cinco anos. Débora e seu grupo publicaram, em 2022, um artigo de revisão no periódico internacional Computer Communications, do grupo Elsevier, no qual descrevem os vários sistemas em testes no mundo.
No grupo da UFF, há projetos de Mestrado e Doutorado com a tecnologia Wi-Fi CSI em diferentes aplicações tanto na área da saúde como em outras. Em um dos projetos, ela conta, há aprendizagem de máquina para identificar uma presença individualizada em um determinado ambiente, ou seja, a rede Wi-Fi é adaptada para distinguir entre, por exemplo, a presença de Maria ou de João. E com isso, também poderá avaliar, de forma personalizada, os sinais vitais de Maria ou de João.
Esse monitoramento contínuo do paciente pode oferecer um melhor conhecimento da condição da saúde e permitir um fluxo de informações mais detalhado para supervisão, tratamento e recuperação. Embora pareça pouco complexo, o uso das redes Wi-Fi com a tecnologia CSI ainda precisa vencer algumas barreiras para que as informações capturadas cheguem aos destinatários sem ruído. Além dessa dificuldade, são ainda necessários estudos que unam os algoritmos de aprendizado de máquina para detectar sinais vitais de forma precisa, ou seja, que sejam padronizados. Fora isso, o potencial é enorme.
Estes estudos fazem parte da rede de pesquisa em saúde e-Health Rio, projeto apoiado, desde 2019, pela FAPERJ e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).