Débora Motta, Marcos Patricio e Paula Guatimosim
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Produção e processamento de alimentos com inovação social foi tema da startup Horta na Floresta, liderada pelo pesquisador da UFRRJ José Lucena (Foto: Paula Guatimosim/Faperj) |
Quando o assunto é empreendedorismo e inovação, a troca de informações e de experiências pode fazer toda a diferença, tanto para aqueles que estão dando os primeiros passos na área, como para os que desejam aprimorar seus projetos, buscar investidores ou conquistar novos fomentos. Atenta a essa questão, a FAPERJ promove em seu estande, na Rio Innovation Week, uma série de 38 palestras. Foi a primeira vez que a Fundação organizou as apresentações em seu próprio espaço, atraindo o público ao seu estande. Nas edições anteriores da feira, pesquisadores e empreendedores apresentaram suas pesquisas e projetos em palcos de uso compartilhado.
As apresentações estão sendo feitas por professores, pesquisadores e empresários inovadores com projetos selecionados em editais lançados pela Fundação. Entre os palestrantes, há contemplados nos programas Startup Rio – Apoio à Difusão de Ambiente de Inovação em Tecnologia Digital no Estado do Rio de Janeiro; Apoio a Projetos Científicos e Tecnológicos em Ciências Agrárias no Estado do Rio de Janeiro; Doutor Empreendedor: Transformando Conhecimento em Inovação; Pesquisador na Empresa; e Apoio à Promoção de Indicações Geográficas no Estado do Rio de Janeiro.
"Nos dois primeiros dias da feira, promovemos um demoday com alguns dos contemplados na edição de 2021 do edital Doutor Empreendedor e o resultado foi excelente. Eles tiveram a oportunidade de apresentar seus projetos e trocar informações, abrindo possibilidades ao estabelecimento de parcerias e, quem sabe, até da realização de novos negócios", disse o assessor da Diretoria de Tecnologia da FAPERJ, Guilherme Santos. "Ao longo dos quatro dias da feira, em programação paralela, tivemos também a presença de pesquisadores e empreendedores contemplados em outros editais, que atraiu um bom público ao estande da Fundação, interessado em descobrir o que fazem esses doutores merecerem o apoio da FAPERJ", ressaltou Guilherme Santos.
Convidado a participar da programação de palestras do estande da FAPERJ, o superintendente da Área de Pesquisa Aplicada e Desenvolvimento Tecnológico (APDT) da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Marcelo Nicolas Camargo, fez uma apresentação sobre os programas da agência destinados ao fomento do empreendedorismo e inovação. Para uma plateia formada por pesquisadores-empreendedores, Camargo enfatizou a importância de editais como o do Programa Centelha II - RJ (Programa Nacional de Apoio à Geração de Empreendimentos Inovadores), uma iniciativa que, no estado do Rio de Janeiro, é resultado de uma parceria entre a Finep e a FAPERJ.
“O Centelha é, sem dúvida, mais uma forma de estimular o empreendedorismo inovador no Rio de Janeiro. Aqueles que ainda não se inscreveram podem fazê-lo aqui mesmo no estande da FAPERJ. As inscrições seguem abertas até o próximo dia 11 de outubro”, afirmou Camargo, após apresentar o programa em detalhes. A segunda edição do edital Centelha no Rio de Janeiro permanece com as inscrições abertas até o dia 11 de outubro.
Sérgio Rodrigues, da startup Lemobs, atua num nicho de grande potencial, apresentando soluções de impacto para o programa GovTech. Certo da importância da inovação para o setor público, ele desenvolveu produtos para a área de saúde, segurança e alimentação escolar, entre outras. Em 2015 ele criou o programa Lixo Zero, realizado pela Comlurb em parceria com a Guarda Municipal do Rio, que multava as pessoas flagradas sujando a cidade. Sérgio Rodrigues conta que para desenvolver soluções para a administração pública por meio da transformação digital com o foco no cidadão, em 2017 e 2021 a Lemobs contou com apoio da FAPERJ. Este ano, a empresa fechou o primeiro contrato, após o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação, com a Petrobras. Entre os casos de sucesso, Rodrigues destaca o programa de alimentação escolar inteligente adotado por sete escolas indígenas com um total de quatro mil alunos, que conseguiu alcançar mais de 80% em economia ao deixar de desperdiçar alimentos. Na área da Saúde, a Missão Amazônia atende a três comunidades às margens do rio Tapajós. Há também projetos de controle do Aedes aegypti por meio de vistorias em prédios públicos, no gerenciamento de obras e na gestão municipal (emergências, gestão de frotas etc), entre outros produtos.
Para vencer os desafios da aplicação da biotecnologia à saúde, Maria Beatriz Mota já contou com ajuda da FAPERJ em dois programas: Doutor Empreendedor e Inserção de Pesquisador em Empresa. Na RioGen ela desenvolveu um método não invasivo para a detecção do câncer de próstata. Segundo ela, cerca de 70% das biópsias de próstata poderiam ser evitadas, se antes delas fossem realizados exames específicos, destinados a diagnosticar o câncer na glândula sexual masculina. Em geral, o paciente é submetido a técnicas invasivas, desnecessárias e a uma situação de estresse que torna tanto o diagnóstico como o tratamento ainda mais difíceis e demorados. A farmacêutica, doutora em Bioquímica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), desenvolveu um exame por meio da análise (biópsia líquida) da urina dos pacientes. Para ela, que sempre pensou em seguir a carreira acadêmica, foi um curso de bioinformática que despertou seu interesse pelo empreendedorismo. Entre os desafios a serem enfrentados ela destaca o alto custo do kit, o longo tempo para o desenvolvimento (incluindo aprovação no Comitê de Ética), o risco tecnológico, o alto investimento e a falta de formação empreendedora. Por isso, ela defende mais incentivos públicos, uma educação voltada para o empreendedorismo e a criação de hubs de inovação especializada.
Um objeto parecido com um brinquedo de criança chamava a atenção do público presente no estande da FAPERJ. Era o dirigível Zefiro, idealizado e produzido pela SyraSolar, empresa que desenvolve projetos e instalação de sistemas fotovoltaicos e de sistemas de aquecimento solar. Como um zepelim de menos de 30 centímetros, Zefiro é um dirigível solar de elevada autonomia (de semanas a meses) para monitoramento contínuo de áreas extensas, como propriedades rurais, linhas de transmissão de energia, projetos de construção civil e como auxiliar na segurança pública, monitoramento de incêndios/queimadas, despejo irregular de esgoto, entre outras. Com câmera interna e capacidade de correção de curso conforme o vento (resiste a ventos de até 10km/h), o Zefiro identifica as ocorrências em tempo real. O projeto já foi contemplado em três editais sequenciais de inovação, tendo recebido R$1,5 milhão em recursos. Segundo Hugo Lisboa, o idealizador do dirigível, o equipamento reúne as vantagens do drone e as do satélite, com maior autonomia e baixo custo. Em fase de ensaios de voos, a SyraSolar disponibilizará a venda, o leasing e a prestação de serviço com o dirigível.
A fim de reduzir o descarte de plásticos no planeta – que chega a 400 milhões de toneladas ao ano em todo o mundo – a Grisea desenvolveu um bioplástico a partir de algas marinhas, mais especificamente a macroalga Kappaphycus alvarezii, cultivada principalmente no estado do Rio e Santa Catarina. Ele destaca que o mercado de bioplásticos (que inclui produtos à base de mandioca, cana-de-açúcar, lixo e até casca de camarão), uma alternativa ao plástico de uso único como descartáveis, sacolas, garrafas PET, cresce a uma média de 14% ao ano. Biomédico, mestre e doutor em Bioquímica, Felipe Teixeira foi contemplado na primeira edição do programa Doutor Empreendedor e agora aguarda investimento para a produção em escala industrial.
A série de palestras contou com dois projetos contemplados no Programa Favela Inteligente em Apoio às Bases para o Parque de Inovação Social e Sustentável na Rocinha. José Lucena Barbosa Júnior passou sua infância e juventude na favela e hoje desenvolve o projeto “Horta na Floresta”. Por meio da inovação social, ele capacita moradores a criarem hortas em lajes, escolherem culturas que promovam a segurança alimentar (uma demanda que teve início na pandemia de Covid-19) e/ou que tenham valor agregado. Um progresso em cadeia também estimulou mulheres a comandarem cozinhas comunitárias, como a Veganna Karioca e a Cozinha de Mãe. Segundo Lucena, o projeto também estimula moradores a criarem abelhas nativas sem ferrão, que contam com a vegetação da Floresta da Tijuca para buscarem pólen e produzirem mel, cujo quilo pode atingir R$400,00.
Já Marcelo Santos Queiróz apresentou o projeto Óleo no Ponto, também desenvolvido na comunidade da Rocinha. Além de recolher o óleo usado por restaurantes e lanchonetes, ele criou uma unidade de beneficiamento que transforma esse produto, antes descartado na rede de esgoto, em detergente, sabão em barra e em pasta. Mais de uma dezena de mulheres hoje têm uma renda porque trabalham no projeto, que conta com a parceria de comerciantes da comunidade para a venda dos produtos. “Nascido e criado” na Rocinha, Queiróz destaca que a marca Sabão no Morro já impediu que 20 mil litros de óleo fossem poluir o meio ambiente, deixando de contaminar meio bilhão de litros de água.
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O CEO da Polimex, Luan Vieira Brito, apresentou os bioplásticos do futuro inspirados na natureza, que se desintegram em cerca de 150 dias (Foto: Débora Motta/Faperj) |
As palestras programadas para a manhã de quarta-feira, 4 de outubro, abordaram temas como saúde, inovação no interior fluminense, produção agrícola e fabricação de alimentos à base de plantas. O pesquisador Conrado Torres deu início às apresentações, divulgando o trabalho da startup Mokapp, empresa apoiada pelo programa Doutor Empreendedor, que faz avaliação tridimensional do movimento humano para identificar patologias e disfunções. A tecnologia, que engloba fisioterapia, inteligência artificial, computação visual, processamento de sinais e gerenciamento de dados, é utilizada para prevenção de problemas de locomoção, orientação de tratamentos fisioterápicos e avaliação da evolução dos pacientes.
Em seguida, o professor Wagner Bretas apresentou as ações de inovação tecnológica que estão sendo realizadas pelo Instituto Federal Fluminense (IFF), uma rede de educação profissional tecnológica com 16 unidades distribuídas por diferentes municípios do interior do estado do Rio de Janeiro, que oferece 120 cursos e atende a cerca de 16 mil alunos. Dedicando-se, atualmente, à criação de sua agência de inovação, o IFF está credenciado perante a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) para o desenvolvimento de tecnologias para produção mais limpa. A instituição vem realizando projetos nas áreas de Eficiência Energética e Fontes Renováveis de Energia; Redução, Tratamento e Reaproveitamento de Resíduos; e Uso Racional de Recursos Hídricos.
O agrônomo Ricardo Galvão, professor do campus Cambuci do IFF, apresentou o projeto de Indicação Geográfica da Farinha de Mandioca de São Francisco do Itabapoana, também apoiado pela FAPERJ. Galvão destacou os desafios e as perspectivas dos agricultores do município, que, apesar de ser o maior produtor de mandioca do Rio de Janeiro, figura entre as cidades com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado. Segundo Galvão, o mercado para o produto, estimado em 3,9 milhões de estabelecimentos, ainda é pouco explorado por empreendedores inovadores.
Finalizando as palestras da manhã, a pesquisadora Gabrielle Gautério apresentou o projeto da Bean Possible, outra startup apoiada pelo programa Doutor Empreendedor. De forma inovadora, a empresa vem utilizando subprodutos do feijão como ingredientes nacionais e sustentáveis para produção de alimentos à base de plantas, os chamados plant-based. Ganhando espaço no mercado, esse tipo de alimento tem como principal público-alvo os consumidores flexitarianos, que são aqueles que optam por reduzir ou limitar a ingestão de produtos de origem animal, sem no entanto interrompê-la por completo. A utilização dos subprodutos do feijão como insumo torna-se uma interessante alternativa, uma vez que atualmente mais de 90% das proteínas vegetais usadas na produção de alimentos plant-based são importadas.
Na tarde de quarta, as palestras tiveram como tema principal inovações voltadas à área de meio ambiente. O CEO da Polimex, Luan Vieira Brito, falou sobre bioplásticos do futuro, inspirados na natureza. Ele explicou que os produtos da startup são 100% biodegradáveis, renováveis e compostáveis. “Nossos bioplásticos utilizam resíduos agroindustriais e produtos agrícolas como insumos, incluindo resíduos da polpa de açaí da Amazônia. Nossa fábrica fica no interior de São Paulo”, contou. Brito lembrou que um plástico normal, oriundo da indústria petroquímica, leva cerca de 400 anos para se degradar, enquanto um bioplástico se desintegra em aproximadamente 150 dias.
Fundadora da SAMPO, Fabiola Maranhão explicou o trabalho da empresa, voltada à remoção de óleos e metais pesados na água. “Desenvolvemos uma tecnologia removedora de poluentes na água, como um filtro, 96% mais eficiente que as tradicionais turfas ou barreiras de contenção. Somos uma startup incubada na UFRJ, com foco na economia azul sustentável”, disse.
O caso da Rocinha como ambiente de inovação social foi tema do pitch de Léo José, do PISTA – Parque de Inovação Social, Tecnológica e Ambiental da Rocinha. O bairro recebeu recentemente apoio do edital Favela Inteligente, da FAPERJ, para o desenvolvimento de diversos projetos inovadores. “Nos locais onde a inovação está na pauta de investimentos, a qualidade de vida da população sempre melhora, com reflexo positivo nos Índices de Desenvolvimento Humano. Por isso é importante manter esse projeto na Rocinha”, destacou. José lembrou que a Rocinha tem como modelo Medellín, na Colômbia, que deixou de ser conhecida como a cidade mais violenta do mundo para a mais inovadora após um trabalho bem-sucedido de integração entre políticas públicas e tecnologia social.
O CEO da BioCorp Soluções Ambientais, Daniel Lima, compartilhou o case de “Água Limpa, Negócios Prósperos: Enfrentando a Eutrofização com Inovação”. Lima contextualizou que mais da metade do esgoto do Brasil, cerca de 55%, é despejada in natura nos cursos d’água. “Nossa proposta é trabalhar a fitorremediação, ou seja, testamos e desenvolvemos plantas, de espécies como taboa e aguapé, que funcionam como um filtro natural, instaladas em uma ilha flutuante nas águas, para impedir naturalmente o crescimento desordenado das algas, no processo de eutrofização”, explicou. Lima está prospectando clientes, entre mais de duas mil estações de tratamento de água e de esgoto pelo País afora.
Outro pitch que abordou a questão ambiental foi o de Victor Hugo Meirelles, da plataforma CITTUA, que trabalha com alertas de riscos climáticos por geolocalização. “Mais de 1500 cidades brasileiras estiveram em situação de emergência ao longo de 2023. Ciclones e tempestades severas são cada vez mais comuns no mundo. Daí a importância dessa plataforma, em escala local e tempo real, com informações compartilhadas sobre as condições climáticas de cada lugar, pelos usuários, que desenvolvemos”, enfatizou.
A produção de bioestimuladores fertilizantes orgânicos esteve em pauta na apresentação de Mariana Collodetti, CEO da Tolveg. Ela contou que criou a startup em 2021, durante a pandemia, com apoio da Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ. “Desenvolvemos tecnologias bioestimuladoras de plantas, para combater o endurecimento dos frutos do maracujazeiro, por exemplo, e contra doenças virais e de nematoides. Apresentamos soluções sustentáveis para o agronegócio brasileiro”, disse.
Por último, o fundador da empresa Tudo Legal, Bruno Lewin, exibiu seu portifólio. Estabelecida em Papucaia, no município fluminense de Cachoeiras de Macacu, a empresa produz as bebidas Coco Legal e Laranja Legal. “Produzimos bebidas naturais, envasadas sem aditivos ou corantes, conservadas a baixa temperatura. Nossa estrela principal é a fruta, e ajudamos a movimentar a economia local”, concluiu.