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Publicado em: 20/06/2024 | Atualizado em: 20/06/2024

Pesquisadores nomeiam primeira espécie de dinossauro para a Bacia Potiguar

Paula Guatimosim

 Tiamat valdecii: seu nome é uma alusão à deusa dos sumérios e babilônios, também conhecida como a 'mãe dos dragões', e também uma homenagem ao arqueólogo Valdeci dos Santos Cardoso (Paleoarte: Luciano Vidal)

Pesquisas conduzidas no Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) levaram à descoberta de uma sequência de vértebras caudais de um titanossauro, com cerca de 10 metros de comprimento e três de altura. O robusto estudo, liderado por Paulo Victor Luiz Gomes da Costa Pereira e coordenado pela professora Lílian P. Bergqvist, conta com parceria de pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Museu Nacional /UFRJ, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern), Universidade Federal de Goiás (UFG),Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) e do Museu Argentino de Ciências Naturais (MACN), de Buenos Aires.

O Tiamat valdecii é a primeira espécie de dinossauro a ser nomeada na Formação Açu. Seu nome foi escolhido em alusão à deusa dos sumérios e babilônios, também conhecida como a “mãe dos dragões”, devido ao posicionamento basal deste dinossauro na linhagem dos saurópodes, além de homenagear também o famoso arqueólogo potiguar Valdeci dos Santos Cardoso, da Uern, que descobriu o sítio onde as vértebras foram coletadas e tem dado fundamental apoio logístico às pesquisas.

“Além da importância científica, Tiamat valdecii reforça o papel preponderante do estado do Ceará no cenário paleontológico nacional, que vai além dos fósseis da Bacia do Araripe, e mostra que a riqueza fossilífera da Bacia Potiguar é bem maior do que os abundantes invertebrados fósseis da Formação Jandaíra, eternizados, entre outros locais, no piso do Museu do Amanhã, no centro do Rio de Janeiro”, explica Lílian Bergqvist, que conta com apoio do programa Cientista do Nosso Estado para conduzir suas pesquisas. Segundo a pesquisadora, a região, antes considerada afossilífera, na verdade é bastante rica, onde muitas famílias – inclusive de dinossauros – já haviam sido identificadas, mas ainda nenhuma espécie formalizada, sendo o Tiamat valdecii a primeira.

À esquerda, mostra das vértebras coletadas; à direita, uma das vértebras, logo que foi coletada, ainda com sedimentos (Fotos: Lílian Bergqvist)

A Formação Açu aflora ao longo da margem da Bacia Potiguar, localizada no extremo leste da margem equatorial brasileira, nos estados do Rio Grande do Norte e do Ceará. A Bacia Potiguar, composta por rochas que datam do início do Cretáceo ao Quaternário, estando localizada, em sua maior parte, no estado do Rio Grande do Norte, mas os melhores afloramentos da Formação Açu encontram-se no estado do Ceará. O Cretáceo é formalmente dividido entre superior e inferior e acredita-se que a Formação Açu seja da porção “média” do Cretáceo.

Até o ano de 2005, fósseis de vertebrados eram desconhecidos na área, exceto pelo achado de umas poucas escamas de peixe. Lílian conta que foi em 2005 que o professor Francisco Pinheiro, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, encontrou os primeiros ossos na Bacia Potiguar. Mas foi apenas em 2015, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que ela obteve apoio para dar início à prospecção e coletas, que resultaram em volumoso material, depositado nas coleções de vertebrados fósseis do Departamento de Geologia da UFRJ.

Os primeiros trabalhos publicados sobre os vertebrados fósseis coletados já demonstravam a riqueza fossilífera da Bacia Potiguar, composta de peixes e dinossauros, mas também fósseis de tartarugas, crocodilos e fezes fossilizadas (coprólitos), assim como sua similaridade com fósseis africanos, já que a Bacia Potiguar representa o último ponto de contato do continente americano com a África. Desde então, Lílian, estudantes e outros pesquisadores têm ido a campo anualmente, em busca do seu principal objetivo de estudo – os mamíferos do período Cretáceo -, que ainda não encontrou em meio a tantos outros fósseis, que já ultrapassam 350 tombos e quase 2 mil exemplares.

Lílian Bergqvist e Paulo Victor Luiz G. da Costa Pereira: os fósseis coletados pelos pesquisadores demonstram a riqueza fossilífera da Bacia Potiguar, composta de peixes e dinossauros, tartarugas, crocodilos e coprólitos

Ex-bolsista de Pós-doutorado nota 10 da FAPERJ até 2023 e atualmente contratado da UFRJ, o biólogo Paulo Victor Luiz Gomes da Costa Pereira foi quem se debruçou sobre a descrição anatômica e a filogenia da nova espécie. Segundo ele, as zigapófises (estrutura de ligação entre as vértebras) indicaram a atuação da cauda e sua posição em descanso, revelando possíveis características de equilíbrio e movimentos. As análises indicavam uma cauda no formato de “s” pouco pronunciado, que ampliavam os movimentos laterais e verticais, sem afetar a integridade das articulações. A cauda, esse enorme apêndice dos dinossauros, poderia ser usada para sinalização e comunicação entre os componentes da manada, como defesa contra predadores, como reserva energética ou dissipador de calor, entre outras funções, especulam os pesquisadores. “Os saurópodes têm uma cauda bastante diagnóstica”, afirma Paulo Victor, que desde criança foi atraído pelos dinossauros.

“Sou da geração Jurassic Park”, diz Paulo Victor referindo-se ao filme de  ficção científica  de 1993, dirigido por Steven Spielberg e baseado no livro homônimo escrito por Michael Crichton. Segundo o biólogo, foi no último ano da formação em Biologia que ele teve a oportunidade de conhecer a professora Lílian, que abriu o caminho para que se dedicasse ao que realmente o encantava. “Tenho tanto prazer pelo que faço que o trabalho nunca me cansa”, garante. Dia 5 de junho, Paulo Victor e Lílian partiram mais uma vez para uma nova expedição na Bacia Potiguar.

Os titanossauros foram o grupo de saurópodes mais diversificado durante o período Cretáceo, com a maior parte de sua diversidade sendo encontrada durante o Cretáceo Superior. “Tiamat valdecii não apenas aumenta a diversidade de dinossauros da Formação Açu, como  também ajuda a elucidar parte da primeira radiação desse emblemático grupo de dinossauros saurópodes – os titanossauros”, afirma Lílian, geocientista considerada pelo World Scientist and University Rankings em 2021 uma das cientistas mais produtivas da UFRJ, do Brasil e do mundo.

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