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Publicado em: 22/08/2024 | Atualizado em: 22/08/2024

Nanotecnologia auxilia na produção de conservantes naturais de alimentos

Paula Guatimosim

Os conservantes extraídos de plantas aromáticas como orégano e alecrim, entre outras, são nanoencapsulados para aumentar sua eficiência (Foto: Gate74/Pixabay)

Conservantes são substâncias químicas (naturais ou sintéticas) adicionadas aos produtos com o propósito de aumentar o seu tempo de vida útil, em especial dos alimentos. Sua função é proteger o produto de bactérias, fungos, leveduras e outros tipos de micro-organismos ou reações químicas que possam torná-lo impróprio para o consumo. Entretanto, a busca dos consumidores por alimentos mais saudáveis é uma tendência que só tende a crescer e vem forçando a indústria a substituir compostos químicos por conservantes naturais, a fim de atender a essa nova demanda do mercado.

No Laboratório de Análises Avançadas em Bioquímica e Biologia Molecular (LAABBM) e no Núcleo de Análise de Alimentos (NAL) do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IQ-UFRJ), o professor do Departamento de Bioquímica e Cientista do Nosso Estado da FAPERJ Carlos Adam Conte Junior desenvolve, com a ajuda da nanotecnologia, conservantes naturais a partir de óleos essenciais de plantas aromáticas. 

Ele explica que os conservantes derivados de fontes naturais, como plantas, especiarias e frutas têm a vantagem de oferecer menor risco de efeitos adversos à saúde, uma vez que não contêm compostos sintéticos, além de serem mais aceitos pelos consumidores, que cada vez mais procuram produtos mais saudáveis e menos processados. “Além disso, muitos conservantes naturais têm propriedades antioxidantes e antimicrobianas que podem melhorar a qualidade nutricional dos alimentos”, acrescenta o pesquisador.

Sua equipe, composta ainda pelo pós-doutorando da Rede de Nanotecnologia da FAPERJ Bruno Dutra da Silva, pelo Doutor Empreendedor da FAPERJ Luiz Torres Neto e pelos doutorandos em Ciência de Alimentos da UFRJ, Ana Julia Amaral e Warryson Lemos, utiliza óleos essenciais para o desenvolvimento de conservantes naturais. Essas substâncias aromáticas concentradas, extraídas de plantas, contêm compostos voláteis que conferem às plantas seu aroma e sabor característicos. Esses óleos são obtidos principalmente por meio de processos como destilação a vapor, prensagem a frio ou extração com solventes. Carlos Conte explica que cada óleo essencial possui uma combinação única de compostos químicos, como terpenos, ésteres, aldeídos, cetonas, e fenóis, que determinam suas propriedades bioativas, terapêuticas e aromáticas. Eles são amplamente utilizados na aromaterapia, cosmética, perfumaria e na indústria de alimentos como conservantes naturais devido às suas propriedades antimicrobianas e antioxidantes.

Equipe se dedica a obter óleos esseciais por meio de processos como destilação a vapor, prensagem a frio ou extração com solventes para testá-los como conservantes naturais (Foto: Arquivo pessoal)

Segundo Conte, que também é pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), entre os óleos essenciais mais utilizados como conservantes estão os de tomilho, orégano, canela, cravo e alecrim, que têm demonstrado eficácia contra uma ampla gama de microrganismos patogênicos e deteriorantes em alimentos. 

“A nanotecnologia melhora a eficácia dos conservantes naturais através da encapsulação dos óleos essenciais em nanoemulsões ou nanopartículas. Isso não só aumenta a estabilidade e a solubilidade dos compostos bioativos dos óleos essenciais, como também pode controlar a liberação dos conservantes ao longo do tempo, aumentando sua eficácia sem alterar significativamente o sabor e o aroma dos alimentos”, esclarece Conte. Para que o aroma e o sabor do óleo essencial não interfiram no sabor do alimento, os pesquisadores utilizam a técnica da encapsulação. Esse processo envolve as moléculas de óleo essencial em uma camada protetora, formando nanoemulsões ou nanopartículas. Essa tecnologia auxilia no controle da liberação dos compostos bioativos de forma lenta e sustentada, minimizando o impacto sensorial. O uso de emulsificantes naturais, como a Tween 80 e proteínas do soro do leite, pode estabilizar as nanoemulsões, melhorando a dispersão dos óleos nos alimentos e reduzindo a percepção de sabor e aroma.

Uma combinação eficaz de óleos essenciais é crucial para melhorar as propriedades antioxidantes e antimicrobianas devido à sinergia entre os compostos bioativos presentes em diferentes óleos. A equipe de Carlos Conte estuda há mais de 15 anos diferentes parâmetros referentes à validade comercial de produtos cárneos, mas foi a partir de 2016 que passou a aplicar a nanotecnologia a alimentos. Desde 2019, por meio do edital das Redes de Nanotecnologia da FAPERJ, conseguiram impulsionar ainda mais esta linha de pesquisa e puderam estudar como diferentes tipos de nanopartículas interagem com diversos compostos bioativos e materiais, e avaliar como esses sistemas podem ser usados em diferentes alimentos.

 "Quando combinados, os óleos essenciais podem complementar e potencializar as ações uns dos outros, resultando em uma eficácia maior do que quando utilizados isoladamente. Além disso, uma combinação de óleos essenciais pode permitir o uso de menores concentrações de cada um, reduzindo assim o impacto sensorial no sabor e aroma dos alimentos, enquanto mantém ou até melhora a eficácia antimicrobiana e antioxidante”, explica o pesquisador. Segundo ele, as combinações de óleos essenciais dependem muito do tipo de alimento e da microbiota presente em cada um deles. 

Os estudos mostraram que quando se quer proteger o alimento contra a bactéria Escherichia coli, o uso de 100% de óleo de orégano foi altamente eficaz. Para Staphylococcus aureus, a melhor combinação foi 50% de óleo de orégano e 50% de óleo de tomilho. Já para Salmonella Enteritidis, a melhor combinação inibitória foi 75% de óleo de orégano, 10,7% de óleo de tomilho e 14,3% de óleo de capim-limão, estudo que derivou em artigos publicados na revista Antibiotics e na revista Food and Bioprocess Technology. Em outro trabalho, publicado na revista  Foods, a equipe testou essa nanoemulsão de óleos na água diretamente em filés de truta arco-íris armazenados a 4°C por nove dias. Peixe rico em ômega-3, a truta tem seu consumo limitado pois é rapidamente perecível. A mistura formulada também foi eficaz em impedir o crescimento das mesmas bactérias contaminantes, destacando seu potencial como agente antimicrobiano em alimentos.

Muitos óleos essenciais, além de suas propriedades antimicrobianas, também são potentes antioxidantes. Isso significa que eles possuem compostos bioativos que não só ajudam a conservar o alimento, mas também podem retardar a oxidação de lipídeos e outros componentes sensíveis à oxidação, melhorando a qualidade nutricional e a validade comercial do alimento. Os testes foram realizados principalmente em carnes in natura e produtos cárneos, pois esses alimentos são altamente perecíveis e propensos à contaminação microbiana. Além disso, a equipe também realizou testes em peixes como salmão e tilápia, além da truta. 

Segundo o pesquisador, a mistura de óleos essenciais é uma alternativa promissora aos conservantes químicos, podendo ser usada em conjunto com outras tecnologias, como embalagens de alimentos que consigam liberar esses óleos de forma gradual. Na indústria, isso pode contribuir significativamente para a segurança alimentar e redução de riscos à saúde pública, além de se tratar de uma tecnologia natural e sustentável. 

Bruno Dutra da Silva (à esq.): o pós-doutorando faz parte da Rede de Nanotecnologia da FAPERJ e integra a equipe de Carlos Adam Conte Jr., professor do Departamento de Bioquímica da UFRJ e Cientista do Nosso Estado da FAPERJ 

“A indústria alimentícia está cada vez mais interessada em alternativas naturais aos conservantes tradicionais devido à crescente demanda dos consumidores por produtos mais saudáveis e menos processados. Além disso, a eficácia dos conservantes naturais, aliada à nanotecnologia, oferece uma solução viável e inovadora para aumentar a validade comercial dos alimentos sem comprometer a segurança ou a qualidade”, garante Conte.

Para viabilizar o uso da tecnologia em escala comercial é necessário otimizar os processos de extração e encapsulação dos óleos essenciais, bem como garantir a sua estabilidade e eficácia em diferentes matrizes alimentares e condições de processamento, explica o pesquisador. Além disso, ele considera crucial realizar estudos de toxicidade e segurança, obter aprovações regulatórias e desenvolver tecnologias de produção que sejam economicamente viáveis.

Os próximos passos da pesquisa devem ampliar os estudos para diferentes tipos de alimentos, otimizar as formulações de nanopartículas para maximizar a eficácia dos conservantes naturais e realizar ensaios de longo prazo para avaliar a estabilidade dos produtos. Recentemente, a equipe solicitou patente da tecnologia junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e pretende trabalhar em colaboração com a indústria para desenvolver aplicações práticas e comercialmente viáveis desses conservantes naturais.

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