Paula Guatimosim
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Espuma escura cobre a orla junto à Av. Niemeyer (Fotos: Divulgação) |
O Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais do Departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ) tem desenvolvido uma metodologia para o monitoramento de microalgas no litoral do estado do Rio de Janeiro utilizando dados de satélite. Esta iniciativa, financiada pela FAPERJ e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico (CNPq), conta com a parceria interinstitucional do Sistema de Monitoramento da Costa Brasileira (SiMCosta), do Laboratório de Fitoplâncton Marinho (Fitomar) da UFRJ, da Rede Nacional de Observação e Monitoramento Oceânico (Renomo), do Laboratório de Microalgas Marinhas (Mimar) da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), do Laboratório de Ecologia e Cultivo de Fitoplâncton da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e do Instituto de Estudos do Mar (IEAPM), da Marinha do Brasil.
Eventos de florações no litoral do estado do Rio de Janeiro têm sido cada vez mais recorrentes e quando são dominados por organismos capazes de produzir toxinas, como Florações de Algas Tóxicas (FAT), podem afetar diretamente a fauna (peixes, ostras ou mexilhões) e flora aquáticas. Em situações extremas, quando ingerida pelo homem, o excesso dessa toxina pode causar náusea, vômito e diarreia. O fenômeno pode atingir longas extensões da costa brasileira. Em julho de 2024, os estados do Paraná e Santa Catarina proibiram a venda e consumo desses mariscos devido à presença de toxina em níveis superiores ao limite máximo permitido por lei. No mês seguinte, as microalgas tóxicas chegaram ao litoral de São Paulo, atingindo cidades como Cananéia, Peruíbe, Praia Grande e São Sebastião. O governo de São Paulo chegou a sugerir a suspensão do comércio e consumo de moluscos devido à possibilidade de contaminação.
De acordo com o pesquisador Lino Sander, o monitoramento dos corpos d’água - termo que inclui as águas do litoral, lagos, lagunas e até reservatórios de hidrelétricas e de abastecimento de água - pelo LASA teve início há mais de sete anos. Professor no Laboratório desde 2019, Sander diz que, já naquela época, o edital Apoio às Instituições de Ensino e Pesquisa Sediadas no Estado do Rio de Janeiro, da FAPERJ, ajudou a viabilizar o início do projeto de “Implementação do primeiro monitoramento biogeoquímico (Turbidez e Clorofila-a) de longa duração e em tempo real para a conexão entre a Baía de Guanabara e a plataforma continental adjacente tendo como plataforma o Sistema de Monitoramento da Costa Brasileira (SiMCosta) ”. Esse programa nacional, financiado pelo CNPq, consiste numa rede integrada de plataformas flutuantes ou fixas, dotadas de instrumentos e sensores, capazes de coletar regularmente variáveis oceanográficas e meteorológicas.
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Estudantes de graduação e pós-graduação do Lasa e do SiMCosta em coleta de campo |
Doutor em Sensoriamento Remoto e docente do Departamento de Meteorologia da UFRJ, Sander explica que o principal parâmetro observado pelos satélites para monitorar a qualidade da água é a sua coloração. A partir da “cor da água” é possível estimar parâmetros como turbidez, componentes orgânicos e inorgânicos, a clorofila produzida pelas algas e até mesmo suas características morfológicas (tamanho e forma). Os dados dos satélites são complementados pela análise da biota microbiana aquática e características bio-ópticas dos componentes presentes na água do mar. “Nosso objetivo é criar um sistema de alerta que identifique o fenômeno e permita aos órgãos públicos tomarem providências ou alertarem a população”, alega o pesquisador.
Neste sentido, o edital Jovem Pesquisador do Estado do Rio de Janeiro, em 2021, e o Programa de Apoio a Projetos Temáticos no Estado do Rio de Janeiro, em 2022, permitiram ao Lasa dar início à criação do Lasa Águas, sistema composto por duas plataformas: Alarmes Água e o AlgaeMAp, que oferecem informações de parâmetros biogeoquímicos a partir do sensoriamento remoto orbital. Particularmente, o projeto temático “Desafios da Exposição Urbana ao Calor Extremo”, também apoiado pela FAPERJ e coordenado pela meteorologista e professora do Departamento de Meteorologia da UFRJ Renata Libonati, tem como foco principal compreender como os eventos extremos que assolam o estado do Rio de Janeiro estão sendo exacerbados não apenas pelas mudanças climáticas, mas também pela crescente urbanização. Nesse contexto, o projeto visa a melhor compreensão dos mecanismos formadores e indutores das ondas e ilhas de calor urbano, avaliando suas interações e impactos sobre os corpos d’água, com a ajuda do sensoriamento remoto.
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Lino Sander: para o pequisador, as soluções devem considerar uma realidade cada vez mais adversa, consequente das mudanças climáticas |
“Além disso, o projeto busca avaliar como esses corpos d’água podem funcionar como atenuadores desses fenômenos”, diz a Cientista do Nosso Estado da FAPERJ. Segundo Renata, uma das metas do projeto é contribuir para a conquista dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), em especial o 3°objetivo (promoção da saúde e bem-estar), o 6º (água potável e saneamento), o 13º (adoção de ações contra as mudanças climáticas) e o 15º (vida terrestre). Ela também destaca o papel do projeto na capacitação de recursos humanos por meio da formação conjunta de jovens pesquisadores na temática multidisciplinar da pesquisa. “Esperamos que o projeto proporcione a consolidação do grupo de pesquisa nessa temática e também possa disponibilizar resultados para que os tomadores de decisão possam aperfeiçoar o processo de gestão e planejamento, a fim de adaptar o ambiente urbano e reduzir sua vulnerabilidade às mudanças climáticas e ao crescente processo de urbanização no Estado do Rio de Janeiro”, conclui.
O pesquisador Lino Sander explica que todos os esforços visam no monitoramento da qualidade da água no estado do Rio de Janeiro, mas que também possam auxiliar na evolução do monitoramento da costa brasileira e até da América Latina, a partir de imagens de satélite. Isso porque no ano passado o pesquisador foi contemplado em mais um edital FAPERJ, o de Apoio ao Jovem Pesquisador Fluminense com vínculo em ICTs do Estado do RJ. Com o projeto denominado “Sistema Embarcado de Aquisição Contínua de Dados Ópticos (ContOPs): Primeiros Passos para o Monitoramento Robusto da Biogeoquímica de Águas Costeiras e de Interior na América do Sul por meio de Sensoriamento Remoto”, ainda em fase final de aprovação, ele pretende construir um Sistema Embarcado de Aquisição Contínua de Dados Ópticos (ContOPs), aplicado às águas costeiras e de interior, como suporte ao monitoramento biogeoquímico mais robusto.
“Buscamos soluções diante de uma realidade cada vez mais adversa, consequente das mudanças climáticas, que impactam a qualidade da água de regiões costeiras e de interior, não só do Brasil, como também da América do Sul”, explica Sander. Segundo ele, a ideia é juntar as duas plataformas. Em estágio inicial de desenvolvimento, elas serão gradativamente aperfeiçoadas para atender às demandas operacionais e científicas.
Acesse artigos publicados na revista Nature sobre eventos externos climáticos globais em: https://www.nature.com/articles/s43017-025-00661-2 e https://www.nature.com/articles/s43017-025-00657-y