Marina Verjovsky
Jogos digitais foram desenvolvidos para aprimorar as capacidades sensoriais, como a identificação de estímulos auditivos e visuais (Imagem: Divulgação) |
Uma pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) revelou que jogos digitais podem melhorar, de forma significativa, a cognição em idosos brasileiros, quando seguem uma ordem específica de exercícios. O estudo, coordenado pelo psiquiatra Rogério Panizzutti, do Instituto de Psiquiatria da UFRJ e Cientista do Nosso Estado da FAPERJ, foi publicado na revista Archives of Gerontology and Geriatrics, no mês de julho.
A pesquisa avaliou 115 voluntários entre 60 e 89 anos, divididos em três grupos. O primeiro grupo realizou 20 horas de treinamento com jogos digitais desenvolvidos para aprimorar as capacidades sensoriais, como a identificação de estímulos auditivos e visuais. Em seguida, completou mais 20 horas com jogos que envolvem atividades cognitivas mais complexas, como treinamento de memória e tomada de decisões. O segundo grupo fez o inverso: começou com o treinamento cognitivo-funcional e depois passou para o sensorial. Já o grupo de controle participou de sessões com jogos comerciais de baixa demanda cognitiva. Cada treinamento teve a duração de 1 hora por dia, em cerca de duas a quatro sessões por semana.
A cognição dos participantes foi avaliada após 20 e 40 horas de treinamento, e novamente após cinco meses sem treinamento adicional. Os resultados mostraram que a cognição global melhorou inicialmente em todos os grupos, mas os ganhos foram perdidos meses após o fim do treino. Os ganhos na cognição se mantiveram apenas no grupo que fez o treinamento sensorial seguido do cognitivo-funcional. Isso indica a importância da ordem dos exercícios para um aprendizado duradouro.
Rogério Panizzutti: o estudo, coordenado pelo psiquiatra do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, foi publicado na revista Archives of Gerontology and Geriatrics (Foto: Divulgação) |
Segundo Panizzutti, essa ordem é crucial devido às perdas naturais das capacidades visuais e auditivas durante o envelhecimento. Essas perdas exigem mais atenção para melhorar a percepção de estímulos, o que pode reduzir a atenção disponível para outras funções cognitivas, como a memória de trabalho.
O estudo reforça a importância de programas de treinamento baseados em evidências científicas. Os jogos usados na pesquisa foram desenvolvidos por neurocientistas norte-americanos e adaptados ao público brasileiro pela startup Neuroforma Tecnologias, criada por Panizzutti e incubada no programa Startup Rio da FAPERJ. Eles estão disponíveis na plataforma Brain HQ (https://br.brainhq.com), que oferece uma variedade de exercícios adaptados ao desempenho individual e disponibiliza alguns gratuitamente.
“Existem estudos mostrando que videogames em geral causam efeitos estimulatórios ao cérebro. Mas o grande achado deste trabalho foi a durabilidade dos ganhos após o treinamento específico, indicando que ele gerou neuroplasticidade. Isso corrobora a nossa teoria de que a população idosa se beneficiaria mais de um treinamento sensorial antes do cognitivo-funcional, devido às perdas naturais da idade", explica o pesquisador. "Cada vez mais observamos que para treinar o cérebro é necessária uma abordagem individualizada, como na atividade física. Ainda temos muito a aprender sobre esses mecanismos, para desenhar ferramentas de intervenção cognitivas cada vez mais específicas e eficazes."